Primeira Carta: por uma educação da ternura, do diálogo e da co-responsabilidade – recordando Paulo Freire...

                                                        A vida é breve, a alma é vasta
                                                                   (Fernando Pessoa)

Caríssimos professores-professoras, educandos e educandas que educam e são educados sob o sol do Equador e a brisa do rio Amazonas...
Escolhemos a sombra de um jambeiro para repousar as nossas tristezas, as nossas preocupações, uma pitadinha de desencanto com tudo que ouvimos, sem perder a nossa fé e a nossa alegria, quando vemos e compreendemos o atual estado da Educação no nosso Estado do Amapá.
Somos um dos grupos de professores-professoras que faz do seu cotidiano um constante desafio em reinventar diferentes maneiras de criar espaços de educação que cuide da VIDA. Este sonho se fortaleceu lá pelo velho e saudoso Instituto de Educação do Amapá-IETA, portanto, temos o dever de continuar a rebelar a nossa ousadia, de questionar a razão pela qual fazemos o nosso trabalho, nosso fazer pedagógico, seguindo a problematizar realidades, coçar almas, semear outros olhares.
Nunca nos negamos dentro de nossa incompletude ao compromisso de educar. Fazemos Educação com carinho, como o jardineiro que cuida com amor de seu jardim. Investimos em beleza e encanto, compartilhando nossos recursos, mas como sempre foi nossa escolha fazer do jeito que fazemos com música, poesia, mística, embelezamento do espaço, com a alegria de que podemos tornar nosso espaço-tempo escolar mais prazeroso de se Viver.
Em 2002, organizamos o Projeto de Formação Continuada com o apoio do atual Governo, o que fortalecia nossa esperança.
Em 2010, construímos o Projeto Semeando. Cada palavra foi escrita com a nossa alma, com o nosso corpo, com toda a nossa inteireza e através dele e com ele viajamos todos os municípios deste Estado, dialogando, vivenciando uma proposta de uma educação que entrelace a cognição com a amorosidade e, sempre, fomos recebidos carinhosamente pelas Escolas e Instituições outras.
Durante esse caminhar em diferentes trilhas, escrevemos a revista “Religando o conhecer ao viver”, com os temas “Avaliação” e “Relações Interpessoais.” Concluímos um livro que conta a história político-pedagógica do IETA (a publicar);  outro livro foi escrito com as experiências educativas vividas durante três anos na Escola Dom José Maritano ( a publicar); e mais dois pequenos livros, um que conta as histórias bonitas e significativas das professoras e professores deste Estado e outro  filho, agora, já concebido,  sobre Conselho de Classe (a publicar). E assim entrelaçamos nossos sonhos com quem acredita que podemos entrelaçá-los com os sonhos de Cora Coralina que nos ensina que nada tem sentido se não tocarmos o coração das pessoas.
Mas, hoje, diante de um cenário um tanto triste e angustiante, começamos a nos perguntar: como Ver beleza no prédio, na sala que trabalhamos, se estão sujos porque não tem material de limpeza? Se não tem água nos banheiros? Se mesmo com salários parcelados, ainda precisamos comprar água, gás, café, material pedagógico...? Como Esperar no sentido do saber complexo, vendo a tristeza e indignação de quem passou a ganhar menos, ainda por ter perdido a regência de classe e mais triste sentir que há mágoas entre quem perdeu a regência e quem não perdeu, talvez, quem não perdeu está com medo de perder, quem perdeu está incrédulo com tantos equívocos.
 Difícil continuar fingindo que está tudo bem. Difícil Abraçar este tempo de muitas cobranças se as condições oferecidas são escassas.
Esta carta é um grito de clamor pelo desejo de continuarmos, acreditando que a Educação é uma ferramenta e um brinquedo na reinvenção do mundo.
Saber conversar é mais um dos saberes do pensamento complexo, nas rodas-oficinas que estamos fazendo. Nas escolas estamos dialogando, enquanto Secretaria de Educação que somos, sobre Gestão democrática,  que não se trata apenas de uma teoria, mas de uma vivência construída na conversa, na partilha de saberes, na alegria de se estar fazendo algo diferente, belo e coletivamente. Mas estamos compreendendo o quanto estamos sendo contraditórios. As pessoas nas escolas estão nutrindo um sentimento de abandono. Estão vivendo no atual momento um constante estado de insegurança, de angústia, de desesperança e isso é triste.
Portanto, em nome do bem conviver e em nome da educação como CULTURA DE PAZ esperamos reconstruir nossos diálogos, enquanto Secretaria de Educação que educa para a vida, que educa pessoas para o Saber amar, para saber cuidar das pessoas para uma sensível reflexão sobre o momento vivido.
Vamos nos escutar com sensibilidade, vamos nos falar, vamos dizer o que estamos sentindo, vamos compartilhar   as belezas de nossas vivências, vamos  reencantar  os nossos sonhos, vamos nos fortalecer nos pilares da educação: aprender a aprender, aprender a conviver, aprender a fazer e aprender a ser.
É o que espera de todos nós, educadores-educadoras, a Comunidade Aprendente deste Estado, em nome da Paz, em nome da Vida...


                                       Deusa Maria Rodrigues Ilário






Ousar recomeçar com a beleza das Orquídeas que brotam nos velhos troncos...
Ousar recomeçar
Falta pão na mesa e perdão entre irmãos,
se sonha na solidão e se esconde a compaixão,
o pão é jogado fora,
enquanto a criança chora pelo mundo afora
a falta de um grão de arroz e feijão
Quem rouba, quem explora,
sabe que a sua hora está perto de chegar.
Falta pão e beleza,
mas sonhar é ousar recomeçar
As sementes se espalham,
mas falta quem semear.
Eu ganhei uma cesta com flores,
 sonhos e sementes
Vem, vamos semear um outro pensar,
amar nas nuvens, dançar na chuva,
acordar a consciência,
desacomodar...
Do meu jardim para você que tem a alma doce e florida! mas também para você que ainda prepara o seu jardim, que desveste a alma e espera pela próxima primavera.
Com o carinho de sempre...
Morna tarde
A tarde estava sombria,
quase que chovia uma chuva morna
Eu decidi voar e logo percebi que
minhas asas tremiam quase encharcadas,
raios incandescentes tremulavam os meus vitrais.
Relâmpagos queimavam minhas penas e asas,
olhar embaçado limitava o infinito,
mas o medo eu o pousei meigamente no horizonte.
Feliz eu fiquei quando os cintos
desfivelaram a minha liberdade
e meus pés tocaram o solo sagrado,
mesmo que calçado com dura capa de asfalto.
A tarde sombria virou uma noite
de alegria, de colo, sorrisos,
saudades e reencontros.
Uma flor para acolher o Amor que se encanta nas pétalas. Nesta flor pousou o amor da lua e a estrela se apaixonou pela gota de orvalho que na folha deslisava...
Rosas e borboletas
Senti saudades de ti.
 Pedi ao artesão da vida, linhas e agulhas
para costurar rosas e borboletas nos teus sonhos.
Rosas para florir o tempo,
borboletas para embelezar os campos
onde estende os teus lençóis.
Senti tristeza por um tempo perdido,
vivido sem sentido e de sentimentos vãos.
A razão não cultivou o mistério
e a emoção não acordou os anjos adormecidos,
não soprou o seu espírito no mundo que sonhou
Hoje, os tambores cantam suas doces saudades.
Sentir saudades de ti...
É preciso aprimorar o olhar para compreender o que os céus têm a nos dizer. É preciso se desprender para ler o que está perto de nós. É preciso deixar Deus pousar em nós para sarar a dor que nos corrói,que aflige o nosso viver... 
Remansos e correntezas
O vento sopra, o galho balança e como numa dança deixa que a semente cumpra o seu destino que é o de, voltar pra terra, germinar, reflorescer, gestar o ciclo continuo da vida.
As sementes que caem na terra, já caem no leito sagrado e fecundante, mas tem sementes que levadas pelo vento caem nos rios e são levadas pela correnteza. Poucas seguem o fluxo ininterrupto dos rios, a maioria vão se juntando pelas margens, criam uma enigmática proteção. As vezes encalham nas ramagens aquáticas e por lá ficam, até que uma grande ventania as arrastem até ao meio intempestivo das águas ou que o tempo as transforme novamente em adubo.
Eu amos as margens dos rios...Quando eu era criança tinha imenso  prazer de catar sementes trazidas pelas águas, elas eram os meus brinquedos. Mas também observava as sementes que seguiam as correntezas dos rios e quão difícil era deter uma delas. Por que, apenas algumas sementes seguem o fluxo veloz das águas? Observo, também que por serem poucas, quase sempre seguem sozinhas. Sozinhas? Não. Elas tem todo o universo com elas. Mas, eu estou falando de sementes... O que será que a natureza me diz através desta observação?
E as sementes que se juntam nas margens, como se essas fossem a sua proteção? O seu ninho? Ou é o se juntar que é a verdadeira proteção? Será que elas, ainda servem como brinquedos para alguma deusa? As que seguiram a correnteza podemos afirmar que vão conhecer o mar? Qual dessas sementes eu gosto de ser? Posso ser as duas ao mesmo tempo?