Linhas e agulhas
Eu amo costurar...
Hoje, costuro o meu olhar embaçado
à asa dos pássaros que atiçam o seu voo.
Costuro o barulho da rua ao silencio do meu quintal, a diversidade de
cantos que ouço vindo das árvores que se fazem passaredos. Costuro o medo da
morte à singeleza da saudade que tanta gente deixa no meu peito. Costuro a
desesperança derramada no meu país a um tempo novo que está surgindo.
Costuro a própria
costurança. Costuro os mistério aos rasgões que existem entre o pensamento e a
espiritualidade; a vagareza dos velhos à correria das crianças; a sabedoria do ancião
a inquietude da juventude. Costuro a plenitude de um tempo que talvez nem
exista à imensidão do espaço, tão largo, tão estreito, tão perto e tão longe ao
mesmo tempo.
Costurar é aproximar, é
juntar retalhos que, mesmo coloridos, se não forem costurados a outros retalhos
perdem o sentido de existirem. Cada retalho é uma totalidade quando com os
outros se transforma em algo maior, belo e significativo.
Costurar requer sabedoria, paciência
impaciente, liberdade para recriar a própria arte, estética, ética, amor...
Já vejo-me em outro tempo
costurando a minha história, os meus sonhos, o devir. Vejo a cadeira de balanço
balançando sozinha, carretéis com linhas, agulhas, fios, rosas, vinhos
espalhados pelo chão. Eu já estou indo, retomar a colcha que por um tempo
deixei esquecida na minha velha varanda...
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